(Imagem da Internet)
No sótão das minhas recordações da escola primária guardo a
campanha eleitoral do General Humberto Delgado e do Almirante Américo Thomaz.
Não porque eles tenham ido pessoalmente fazer campanha eleitoral à recôndita
aldeia beirã onde nasci, e onde frequentei a escola, mas porque, os meus 10 anos de
então me permitiram reter aquela novidade, e os 65 de hoje me permitem evidenciar, a esta distância de conhecimentos, a desigualdade
de meios e de delegados políticos a que ambos tinham acesso.
Por Thomaz Faziam campanha o presidente da Junta de
Freguesia, o médico, o padre - que nas suas homilias exorcizava os inimigos da
Pátria daquém e dalém mar - e a professora. Por Delgado faziam campanha uns desconhecidos, aos quais
os locais, desconfiados, eram por isso hostis, que apareceram uma ou duas vezes
a distribuir uns panfletos com uma foto do General e um texto no verso.
No dia da votação, palavra então desconhecida, fui
acompanhar o meu avô à sede da freguesia para votar. Não sei em quem é que votou, mas sei que, com fraude ou sem fraude, o Thomaz ganhou por
muitos, e ainda hoje continua a ganhar por aquelas bandas. Não ele, claro, mas os seus herdeiros do pensamento politico.
Na altura não compreendi o que se passou. Só mais tarde, já
no serviço militar, quando comecei a ter consciência politica, entendi a enorme manipulação que foram aquelas eleições, não só pelo uso e abuso das estruturas do Estado em favor de um candidato, mas também pela "propaganda oficial" e pela desproporcionalidade de meios que o Estado colocou à
disposição dos candidatos, desde logo a mobilização dos caciques locais (no sentido
político de pessoa que dispõe dos votos da sua localidade e tem grande poder
localmente) acima referidos, que se encarregavam de “modelar” o pensamento e os atos dos cidadãos desinformados, impreparados, quase analfabetos e humildemente submissos.
Era assim naquela época do Estado Novo. Tudo o
que envolvesse politica (vem a propósito relembrar que o termo tem origem no grego politiká, uma
derivação de polis que designa aquilo que é público conceito a
que mais tarde se associou a noção de ciência da governação de um Estado ou Nação) era proibido. Era
proibido falar de politica, proibido escrever sobre politica, e sobretudo era
proibido praticar a politica. Isso estava reservado para uns quantos iluminados
que se arrogavam ao direito de decidir o que é que o povo deveria querer e assim
decidir por ele.
Passados 57 anos sobre aquelas eleições e 40 sobre o 25A74,
até pode parecer que estamos muito melhor, que temos liberdade de escrever e de
falar sobre o que muito bem nos aprouver, que podemos votar livremente, e que
somos donos e senhores dos nossos direitos de cidadania. Pura ilusão e pura
mentira de quem nos faz crer que assim é. A instrução, as técnicas, as tecnologias e as
mentalidades evoluíram, é um facto, mas os condicionalismos continuam os mesmos, travestidos com outras roupagens, veiculados por mensagens bem buriladas,
concebidas em conceituadas e especializadas empresa de marketing e de criadores
de opinião. Continuamos a ser manipulados e condicionados nas nossas decisões,
aos mais diversos níveis, nos mais diversos universos, desde o politico ao dos
media passando pelo económico e social, para não falar no psicológico o mais
perigoso dos condicionantes da liberdade individual.
A quem discorde de que somos cientificamente manipulados faço apenas uma pergunta de resposta
simples: - É dos que acredita que os jornais, as TVs e as rádios nunca abrem os
seus espaços noticiosos de referência com notícias positivas, porque
efetivamente não as há? Nunca se apercebeu que o invariável método de iniciar notícias com desastres, calamidades notícias de horrores, guerras…. É
uma forma de manipulação da nossa mente e da nossa personalidade?. Ao fim e ao
cabo de nos preparar para a punição e nos manter na constante angustia sobre o
que virá a seguir e aceitar que seja mau, desde que não seja tão mau assim.
Atente-se, por exemplo, na forma como os anúncios de medidas
que se destinam a castigar o "povo gastador", que o governo tem implementado nos últimos 3 anos, ou na
propaganda que é montada sempre que qualquer indicador cresce uma milésima
depois de ter caído várias unidades.
Nada disto é novo. Foi e é praticado por vários governos em variados países, quase sempre sob a capa protectora da democracia. Mudaram os meios,
mas não os métodos. A prova mais recente é a “Operação Marquês”, qual Santa Inquisição, na qual os suspeitos já estão condenados antes mesmo de qualquer acusação.
Existe
porém um pequeno pormenor que empanca a engrenagem que esta malandragem
manobra, pormenor que consiste no facto provado de que uma mente estruturada
raramente se aliena, se omite ou se demite de pensar por si própria. Felizmente
é com essas que a Humanidade tem contado para resistir às tentativas de
alienação coletiva, como a que tem sido tentada em Portugal nestes últimos 4 anos.
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