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quinta-feira, 19 de maio de 2016

Bancos ou Casinos?


(imagem da Internet)

Já por aqui escrevi que trabalhei na banca umas boas dezenas de anos. Quando nos idos anos 70 nela me iniciei os bancos eram instituições respeitáveis aos olhos da população e os banqueiros e gestores pessoas confiáveis.
Em 11 de Março de 1975, quase um ano depois do 25 de Abril, os bancos com capitais nacionais foram nacionalizados, os seus “velhos gestores” e proprietários foram afastados. As forças politicas do novo regime fizeram valer as suas influências e começaram a chegar à banca uma nova estirpe de banqueiros e gestores de aviário (isto não tem nada de politico, refiro um facto que vivenciei) alguns deles sabiam o que era um banco por serem clientes de um.
Ainda assim a banca em geral soube-se adaptar, renovou quadros, contratou novos gestores profissionais e continuou confiável e a desempenhar bem o seu papel de motor da economia - mau grado as taxas de inflação da ordem dos 30% ao ano - e a gerar resultados positivos com significado (em jeito de piadola até comentávamos, sempre que eram publicados os resultados de um banco, “olha o que seria se fosse bem gerido”).

No advento do ressurgimento de novos bancos de iniciativa privada, em meados da década de 80, começaram a surgir no centro e norte da Europa, vindos dos EUA e do Japão, uns “bichos estranhos” denominados de Novos Produtos Bancários. A moda chegou cá num ápice, pelo que havia que perceber, rapidamente e em força, de que se tratava e fazer formação a martelo. Recordo-me de um velho amigo da área comercial, numa formação que fomos fazer ao Instituto Bancário de Paris, me dizer um dia “estamos tramados pá, até aqui vendíamos e comprávamos dinheiro, agora vamos passara a negociar fumo”.
Para quem não está familiarizado com o assunto, devo dizer que nesses primórdios os tais “novos produtos” pouco tinham de especial, limitavam-se a instrumentos de cobertura de risco (de câmbio, de taxa de juro, etc.), por exemplo, um cliente que exportava (vendia) em Yens e queria garantir que quando recebesse, o contravalor dos Yens era o mesmo que quando fez o contrato com o seu cliente, fazia com o Banco um contrato equivalente noutra divisa, p. ex. em Dolares, transferindo para o Banco o risco cambial e pagando a este  um fee. Este “produto” , chamado instrumento de cobertura de risco cambial, era, e é, é bastante útil para as empresas e está hoje massificado com o nome de “swap cambial”.

O verdadeiro problema com os “novos produtos” surge nas décadas seguintes. Como nestas coisas da finança há sempre uns artistas que não dormem durante a noite a pensar como hão de enriquecer no dia seguinte, mentes altamente criativas do lado de lá do Atlântico e tirando partido dos meios informáticos que se começaram a generalizar, dedicaram-se a transformar a banca num casino. Sustentados em produtos confiáveis (Contratos de Imobiliário, Swaps, CDS, Contratos Futuros de ações e de bens de consumo como o petróleo, trigo...etc.) desataram a criar nos seus bancos produtos especulativos – produtos onde uma das partes, normalmente o Banco, tem condições para forçar a subida ou descida do valor de um instrumento financeiro em seu favor - e começou a jogar-se à roleta na Banca, lá e cá. Vende-se o que não se tem, compra-se o que não existe e contratualiza-se por 5 milhões aquilo que realmente vale um milhão e quando chega o incumprimento haverá sempre um banco que arde com o “fumo” que comprou, ou com 4 milhões. Foi assim nos EUA e na Irlanda e um pouco por essa Europa fora. Por cá foram mais os contratos com os “patos bravos” que levaram a massa dos bancos e deram como garantia imóveis que hoje quase nada valem, estando os diferenciais contabilizados em “imparidades” (valores tendencialmente irrecuperáveis).

No meio deste jogo de roleta, em 2008 estoira o 4º maior banco Americano de Investimento, o Lehman Brothers Holdings Inc.  que arrasta na queda centenas de outras instituições financeiras nos Estados Unidos e no resto do mundo, desencadeando-se a maior crise financeira mundial de que há memória; Sim a crise não é económica como nos querem fazer crer, a crise é antes de tudo o mais uma crise financeira (todo um sistema financeiro incapaz de solver os seus compromissos porque os seus ativos se desvalorizaram muito e rapidamente). A juntar a isto, e como se já não fosse pouco, surgem as instituições financeiras especuladoras que manipulam os mercados e apostam na desvalorização de tudo o que ainda tem algum valor. Há atualmente notícia de que apenas 10 (dez) bancos são proprietários de 60% da riqueza mundial desvalorizada em 95% do seu valor de 2008.

Aqui chegados, sobretudo em Portugal, estamos onde estamos, manietados de mãos e pés pela Europa, a aguardar um milagre e sem qualquer estratégia para sair deste grande casino em que a banca se transformou, e não é certamente por acaso que ainda anteontem os banqueiros portugueses rejeitaram a uma só voz a criação de um “instrumento” (Fundo p. ex., como já fizeram os Italianos e a Espanha e França preparam) onde seriam colocados os ativos tóxicos (as tais imparidades) de todos os bancos e estes seguiriam a sua atividade sem “lixo debaixo do tapete” mas com rédea curta. Eles lá sabem porque rejeitaram talvez queiram continuara jogar à roleta, mas receio que vão ficar sós no terreiro porque os Americanos já trataram da vida e o resto da Europa está a fazer o mesmo. Quando estoirarem cá estamos nós, os contribuintes, para pagar com língua de palmo e, mais uma vez, sem bufar.

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